quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

ossos e fluido

Nunca amara ninguém. Nunca sentira a loucura. Confundia ego ferido com amor não correspondido. Assim se sentia mais humana. Se sentia mais que ossos e fluido. Quantos corações enganara? Quantos corações iludira? Se soubessem que o fazia também a ela mesma, a perdoariam? Quando a dor do nada era maior do que podia suportar, ouvia músicas tristes para fingir que havia algo dentro de si. Chorava na esperança de que as lágrimas lavassem sua culpa. Não, ela nunca amara ninguém. Mas continuava a lamentar suas paixões cessadas. Sabia que seu coração, pulsando apenas sangue, era demasiado insignificante para se viver por ele. Inventava, reinventava, cutucava feridas inexistentes e chorava por um amor que nunca sentira.

sábado, 19 de novembro de 2011

Azul



Hoje a tristeza amanheceu comigo.
Acordei. Olhei pro lado.
Lá estava ela.
Insistiu.
Persistiu.
Eu a deixei ficar.
Passou o dia comigo.
Às vezes, me raptava a um universo paralelo
De recordações e remorso
Tirava minha concentração.
Outras, eu a procurava
pra me refugiar em seu silêncio.
Me acompanhou no jantar
regado a músicas azuis.
A descobri bonita.
Amiga.
Depois que se acostuma, ela não incomoda tanto.
Ao findar do dia, deitou-se comigo.
Foi se diluindo
Desaparecendo
Tão sorrateiramente quanto quando chegara.
Deixou, assim, um vazio
Que eu teimo em não preencher.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

2 segundos


Ontem, no trem, um gesto me chamou atenção. A parada em uma das estações, antes de desembarcar, um homem fez o sinal do cruz e só então seguiu. Como pouca religiosa que sou, o primeiro pensamento que me veio a mente me fez rir: em quais situações as pessoas costumam se benzer? Em situações desafiadoras ou perigosas. A idéia de aquele homem ter medo de um simples trem me pareceu cômica demais. Depois me condenei por esse pensamento. Observei mais atentamente o homem. Roupas gastas, um olhar cansado. Linhas de expressão muito marcadas e pele maltratada pelo sol. Passava das dez da noite e muito provavelmente aquele senhor de quarenta e poucos anos estava voltando de um dia duro de trabalho. A julgar pela aparência, sua situação financeira não devia ser exorbitante. Revi as possibilidades. O que ele poderia estar pensando quando levou a mão à testa, ao peito e depois aos ombros? Talvez tenha sido um “Muito obrigado, Senhor. Estou chegando em casa em segurança e gostaria de agradecer por ter me acompanhado e pedir que continue me guardando.” Ou quem sabe “O que aconteceu agora há pouco não foi fácil e agradeço por ter iluminado minha mente e ter me guiado para o caminho correto.” De qualquer forma, foi uma manifestação de fé.

Todos os dias, no caminho de volta do trabalho, a condução passa em frente a uma igreja católica e sempre é possível testemunhar algumas pessoas se benzendo ao vê-la. Já estou habituada, de forma que isso não me comove mais. Mas aquele senhor, naqueles dois segundos, me fez repensar meus hábitos cristãos. Não sei bem o que ou por que me surpreendeu. Talvez tenha sido o ambiente, talvez já tivesse inclinada a rever minha fé, talvez tenha sido sua expressão de bravo que tão fortemente contrastava com seu gesto. Ele me fez sentir culpa. Culpa por aquele poder ser um gesto rotineiro para ele e estar tão distante da minha realidade.

Sou cristã. Acredito piamente em Deus. Mas até que ponto levo isso em minha vida? Há quanto tempo eu não orava? Há quanto tempo não dizia verdadeiramente o Seu nome? Há quanto o tempo o subestimava invocando-o deliberadamente em frases que perderam totalmente o sentido devido a repetições desrespeitosas? “Pelo amor de Deus”. Tempo demais. Essa constatação pesou em meu peito.

Aquele homem, aquele gesto podiam ter passado despercebidos em meio a tantos passageiros ou simplesmente terem sido ignorados enquanto prestava atenção no que era reproduzido pelo meu mp3. Não sei quais serão as conseqüências de ontem, não sei se vou conseguir mudar, não sei se vou conseguir trazê-Lo de vez para minha realidade. Mas sei que o convite está feito.

sábado, 20 de agosto de 2011

gelo & fogo


Da janela da sala de aula, enquanto observava o pinheiro se movendo com o vento, no pátio da escola, estive pensando em tudo que se passou conosco. Nós costumávamos parar ali, na sombra daquela árvore, pra você me aconselhar, eu te ajudar com a matéria ou simplesmente para jogarmos conversa fora, fugindo das aulas de religião.

Às vezes me pego fitando por tempo demais as letras que entalhou no tronco. Você se lembra? Era julho e fazia tanto frio que sequer tirávamos as luvas para copiar a lição. Você me fez rir só de aparecer toda empacotada com sua blusa de lã, moletom, casaco, cachecol, toca, duas calças... enfim, mais agasalhos que o necessário. Ainda hoje acho graça da tua expressão de raiva quando zombei do teu excesso de frio. Você se irritou tanto por tão pouco. Então você riu e disse: “não sou eu que sou frienta, você que é muito fogosa.” E foi minha vez de rir. Nossa vez. Gargalhamos tanto que as pessoas em volta ficaram curiosas e nós com dores no estômago.

Foi assim. Não foi uma briga, também não foi uma piada. Na verdade, nem teve tanta graça assim. Nosso riso foi a válvula de escape para o nosso medo, nossa saudade precoce, nosso segredo. Porque sabíamos que aquela poderia ser a última vez que riríamos juntas. Porque sabíamos que você estava indo embora. Porque sabíamos que se não as transformássemos em sorrisos, logo viriam as lágrimas.

Você tirou da bolsa o canivete improvisado, feito de lâmina de apontador e tubo de caneta bic, como eu havia lhe ensinado, e começou a escrever no nosso pinheiro. Sem dizer nada. Quando terminou e pude ler “Gelo e Fogo”, me mantive em silêncio. Você estava séria, como se estivesse refletindo no significado de cada letra torta. Um significado grandioso, que só nós duas entenderíamos.
Naquele momento nossa amizade foi eternizada. E não sorrimos mais.

De vez em quando, nos intervalos entre uma aula e outra, fico debaixo daquela sombra. Refaço com o dedo cada letra. Reforço o nosso pacto silencioso.

Não fujo mais das aulas de religião, e pra ser sincera, agora até gosto. É quando, observando o nosso pinheiro, peço pra Ele te guardar, onde quer que esteja.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

impulso paranóico


Minhas mãos sentem meu corpo
De uma forma estranha, ainda pulsa
Não fica difícil de acreditar
Quando toco tudo o que foi destruído
Mas ainda respiro.

Ideias atravessam minha mente
Como raios que abalam uma construção
E o medo do meu ódio corrói minhas entranhas
Mas continuo viva.

E tudo torna a fazer sentido
Enquanto veias e artérias sangram num grito letal
Sentindo a falta do coração que eu arranquei pra te dar.

Eu ainda penso.
Eu ainda respiro.
Eu ainda vivo.
E tudo volta pro lugar.

meus traços





Meu bem, descansa .Tudo vai ficar bem.

Basta lembrar do que fomos,
temos, sentimos e somos
E, amanhã, de um jeito incerto
Você me sentirá mais perto.

Guarda essas tralhas, amor
Já não fazem sentido
Ouve a canção que te fiz
Eu ainda estou contigo.

Refaz nossos passos
Reconheça meus traços
Me sinta nos braços
Recolha meus pedaços e os guarde só pra si.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

lembranças, joplin e chardonnay


Quando cheguei do trabalho e vi suas malas perto da porta não acreditei que fosse sério. Fica fácil não dar tanta importância a algo que acontece frequentemente. Afinal, quantas vezes você esvaziou aquele armário? Você sempre voltava. Mesmo com todos os meus defeitos, nossas discussões e suas tentativas de me fazer mudar, eu tinha certeza do seu amor por mim. Pois no final da noite você estava lá, deitada ao meu lado. Às vezes com a cara amarrada, até eu te fazer rir. Sua expressão dormindo sempre me inspirou algo divino. Eu devia ter percebido que algo estava errado quando os períodos na casa da sua mãe se tornaram mais longos.

Foi estranho não te ver chorar ao dizer que estava indo embora. Eu estava habituado a isso. Suas lágrimas denunciavam que ainda havia algo especial por mim aí dentro. Isso me confortava. Eu nunca te contei que permanecia do lado esquerdo da cama na sua ausência, não é? Achei engraçado me fazer prometer que iria ficar bem quando, na verdade, se realmente se importasse comigo você estaria aqui agora.
Acho que jamais te disse que nunca chorei por você. Mesmo quando atravessava aquela porta levando pedaços de nós. Eu colocava seu disco favorito (aquele que não suporto e que não te deixava ouvir quando estava em casa) e ficava entoando Pieces of heart enquanto secava garrafas daquele vinho que gosta tanto. Agora a voz rouca da Janis é a única que se ouve nesse apartamento. O lado direito do edredom continua intacto e terei de sair pra comprar mais Chardonnay. Não sei por quanto tempo será assim e também não me importo. Vou me acostumar.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

pra não dizer que te amo


Pra não dizer que te amo
Pinto o mundo de grafite
Mudo o sentido da grafia
E o significado das palavras
Corto ruas, dobro esquinas
Invento toda uma filosofia
Troco o tempo dos verbos
E digo do amarei que sentia

Pra não dizer que te amo
Inverto as letras do alfabeto
Ponho o sol à meia noite
E cinco luas na matina
Confundo a psicologia
E semeio giraluas
Volto a ser uma menina

Pra não dizer que te amo
Emudeço sem razão
Desabrocho flores mortas
Pulo os dias, minto as horas.

Para que tentar dizer com fonemas sem expressão o que os olhos gritam tão bem?

aqui jaz minha disposição para amar


Por que enterros são tão tristes?
Não devia ser assim. Por que na verdade quem sofre é quem fica? Estou aqui no meu mundo. Já o conheço, sei as todas as regras e vou sobreviver a ele. Vou buscar minha felicidade fria.
Você. Você vai pra tua caixa escura e mantenha-se lá. A 7 palmos da superfície e 7 mil metros de mim.
Se você quiser, toco uma música triste na hora de dizer adeus e derramo algumas lágrimas (algumas mais não fazem diferença). E no discurso fúnebre posso dizer também que aprendi muito contigo, não estaria mentindo. Mas não posso agradecer por ter te conhecido.
Aliás, vai tarde. Quem foi que te ensinou a ser assim? Invadindo a privacidade e rotina alheia? Quem te deu autorização pra bagunçar a vida das pessoas? Com seus alucinógenos e inibidores de apetite.
Vai. Mas dessa vez, vê se fica aí embaixo por mais tempo. Com a sua sorte e o meu azar, logo, logo alguém vem te ressuscitar.
Mas por enquanto fica aí.

terça-feira, 12 de julho de 2011

neologia

















 


Te expus as palavras
E elas caíram em seus pés
Mas sequer as olhou
E permaneceram ali
Como se nunca tivessem sido ditas.
Em meu último monólogo elas pairaram no ar
Sinto que se fechar os olhos ainda as verei
Esperando que as vá resgatar.

Eu vi o teu espetáculo
Estava na primeira fila
Mas você não me viu
Aplaudi o seu clímax
Quando todos o vaiavam
Te enxerguei da melhor maneira
Pelos olhos de quem espera
Suportei tudo o que sentiu

Examinei tuas palavras escritas
Guardei-as na gaveta
Junto a teus silêncios
Elas morreram em meus lábios
Antes que pudesse notar que quem morria era eu.

domingo, 10 de julho de 2011

fechando e abrindo a geladeira a noite inteira... ♪♫

Deitar, dormir. Fechar os olhos. Abrir os olhos. Ler um livro. Ouvir música. Assistir TV. Reorganizar o armário. Por os livros em ordem alfabética; e os CDs e DVDs em ordem crescente de ano de lançamento.

Volta ao começo.

Encostar a cabeça no travesseiro. Fechar os olhos. Abrir os olhos. De novo. Dormir, dormir, dormir – coisas demais na mente –. Conversas inacabadas, gritos guardados, sentimentos inalteráveis, lágrimas reprimidas. Minha cabeça girando, girando, girando.

Mais uma vez. Deitar. Respirar. Concentrar. Ler.

“Foi quando meu pai fez menção de se levantar. E, agora, era a minha...”– Brigas; risos; você; declarações –. Esquecer. Tentando: “...era minha vez de segurar...” – Você – “segurar a...” – Nós – “...a sua perna. Mas ele tirou a minha mão...”*. – Você; nós; ela; você e ela. Tudo rodando aqui dentro. – “Foi quando meu pai...”. Desistindo.

Eu me desvencilhando de você.

Deitar. Fechar os olhos. Abrir os olhos. O teto. Mais uma noite longa...



(*Trecho retirado do livro O Caçador de Pipas – Khalled Hosseini)

púrpura, gris e escarlate















 



Dentro de mim há as respostas
Uma porção de soluções óbvias
Entre massa cinzenta e neurotransmissores
Existe algo além da compreensão
Em meus olhos há o delírio
O ludíbrio de uma mente sã
A porta aberta e a placa de adeus
Revelando o que nunca existiu
Na minha pele manchas azuis
Cicatrizes da auto-afirmação
Cortes recentes e mágoas antigas
Marcas da busca do sonho
E este mundo é meu
É tudo que sou e que tenho
É idéia, mágica, engenho
É a perfeição que eu invento
E este mundo é meu
É o púrpura, gris e escarlate
A mentira, omissão e a verdade
É o tom da minha perversidade.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

assalto a banco


- Qual é o problema?
- Eu não consigo ser feliz. Talvez seja um pico de stress ou início de depressão.
- Ainda faz análise?
- O Vieira me deu alta. Já faz um mês.
- Então você vai ficar bem agora?
- Teoricamente.
Silêncio.
- Qual é o problema?
- Lennon, meu gato. Morreu.
- Você está bem com isso?
- Durante o dia, no trabalho, fica tudo bem. Você já reparou como o silêncio tem a capacidade de fazer a gente refletir? Dá pra entender os castigos da mamãe.
- Ela nunca foi fácil.
- Foi esperta. Eu a amava.
- Eu a amo.
- A TV lá de casa uma droga. O receptor quebrou. Tudo bem, eu já nem assistia mesmo. Dei pra alugar filmes de drama. Chorar por indução. Não dizem que faz bem?
- Realmente.
- É, faz bem. Deve funcionar melhor quando é espontâneo e não planejado por um diretor de Hollywood.
[...]
- Quer ouvir música? Baixa não tem problema.
- Nunca gostei.
- Eu me esqueci. Faz tanto tempo.
[...]
- E então, qual é o problema?
- Eu engordei. Três quilos.
- Você está ótima. Ótima e paranóica.
- Foi o que o Vieira me disse na última sessão. Sem o “paranóica”, claro. Ele me disse pra viajar, reencontrar amigos, familiares.
- Você está bem com isso? Agora?
- Não. Lembranças demais.
- Antigo namorado?
- Antigas ilusões, frustrações, mágoas, decepções. Ele casou sabia?
- Bete me contou.
- Dizem que tem uma filha linda. Ele sempre quis ter uma menina. Sofia, já tinha escolhido o nome.
- Achei que não o amasse.
-Nunca amei. Mas podia ter amado. Eu podia ter sido a dona daqueles cinqüenta metros quadrados e dividir o Civic e andar de jeep nas férias.
- Você o ama agora?
- Não, mas gostaria. Como é, hein? Como é sentir que existe alguém que nos completa? Que é mais importante que nós mesmos? É...eu gostaria.
[...]
- Comecei a fumar.
- Mas você já fumava.
- Dois cigarros por mês não causam câncer. Falo de ir a venda e pedir o maço.
- Você quer ter câncer?
- Eu não sei.
- Você quer morrer?
- Não, é fácil demais. As pessoas dizem que quando você passa por uma doença séria assim, é como uma purificação. Você reencontra teu caminho, teu eu, tua alma, como quiser chamar. A vida volta a ter sentido. Reaprende o significado de família.
- Você não sabe?
- Não sei se sei. Quer dizer, nós somos, não somos?
- Sim, nós somos.
- Quero ter um filho.
- Formar sua própria família?
- Não. Eu gosto da nossa. Só ter alguém que dependa de mim. Alguém que eu possa mostrar o certo e o errado. Que eu possa dizer pra olhar pros dois lados antes de atravessar a rua, coisas do tipo.
- Alguém pra dar sentido a sua vida? Para amar incondicionalmente?
- É, acho que é isso.
[...]
- Então, está bem agora?
- Sim. Só passei pra dizer que te amo.
- Eu também te amo, viu?
- Vi.

      Ela levantou da poltrona surrada pelo tempo e pelo uso das tantas pessoas e familiares das pessoas que ocuparam aquele leito. Caminhou até a janela e a fechou, afinal era julho na terra da garoa. Abriu a porta e deu uma última olhadela nele. Lembrou de quando era apenas um menino no colo de dona Augusta.
    Quando deixou o prédio, de um branco sujo por padrão, desceu a avenida vagarosamente, como há tempos não fazia. Chegou mesmo a sorrir pra um garotinho que acenava da janela do carro parado no sinal. Tomou o ônibus, desceu no antigo bairro e observou a linha do trem, lembrando de quando era menina e atravessava correndo por medo de vir uma locomotiva. Fechou os olhos tentando visualizar as crianças debochando de seu temor. Ela não tinha mais medo. Cortou caminho por um beco pra chegar à velha lanchonete. Seguiu pela calçada e quase não sentiu dor quando um projétil atingiu sua nuca, vindo da agência bancária paralela a ela do outro lado da rua.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

rascunho de carta a um velho amigo



Petrolina, 29 de Agosto de 2003

Olá, querido Pedro

Tudo bem com você? Espero que sim. Faz tanto tempo que não nos vemos. Desde o Ensino Médio no EMAF, lembra? Bons tempos.
Bem, você deve estar se perguntando como consegui teu endereço. Não fique bravo com ela, mas eu encontrei sua irmã Helena no mercado outro dia e ela anotou pra mim. Ela foi tão simpática e concordou que não haveria problema já que fomos íntimos amigos no colégio. Aliás, seus sobrinhos são muito bonitos, como você, devia vir visitá-los. E se você vir podíamos jantar juntos almoçar juntos reunir o pessoal.
Sabe, sondei encontrei com seu velho amigo Marquinhos e ele me disse que perdeu contato contigo. Se te interessa, ele está muito bem. É gerente de uma rede de postos de gasolina agora e tem uma família linda.
Ah, encontrei seus pais nas barraquinhas do Bairro esse ano. Conversamos tanto, rimos um bocado! Foi sua mãe quem me disse que você estava em São João Del Rei, mas não sabia teu endereço (e soltou onde Helena costuma fazer compras). Como você foi parar aí???
Enfim, uma série de investigações coincidências me trouxe notícias suas então eu resolvi entrar em contato. Saber como anda sua vida, afinal já se passou oito anos e cinco meses uns oito anos e nunca se esquece o primeiro amor um amigo de escola.

Responda logo ou, por favor, entre em contato pelos telefones que anotei abaixo. Só pra sermos um pouco nostálgicos.

Da sempre sua sua amiga,
Michelle.

domingo, 5 de junho de 2011

plantando morangos no concreto

Uma amiga que eu chamo de “Crítica” me apresentou a ele. Ela tem nome, mas essa palavra me faz lembrar ela. Ela disse que eu devia procurá-lo, que ele tinha algo a dizer. Pergunte sobre os sobreviventes, ela disse. E eu o fiz. Ele me veio assim, trajado humildemente. De falar simples, mas expressivo. Às vezes confuso - um tanto redundante. Mas era ele.

Me raptou, sem fazer menção a resgate. Me seduziu e me desnudou da forma mais bonita. Me expôs as minhas verdades. E as dele. Me envolveu numa atmosfera de dor, ódio e angústia. Me deixou no escuro. E no final de tudo, com o sorriso mais cínico, deu-me rastros do Sol. Me prometeu que tudo ficaria bem. E eu acreditei. Eu acreditei...

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Nem um pouco pseudo amigas

Já escondi um AMOR com medo de perdê-lo, já perdi um AMOR por escondê-lo.
Já segurei nas mãos de alguém por medo, já tive tanto medo, ao ponto de nem sentir minhas mãos.
Já expulsei pessoas que amava de minha vida, já me arrependi por isso.
Já passei noites chorando até pegar no sono, já fui dormir tão feliz, ao ponto de nem conseguir fechar os olhos.
Já acreditei em amores perfeitos, já descobri que eles não existem.
Já amei pessoas que me decepcionaram, já decepcionei pessoas que me amaram.
Já passei horas na frente do espelho tentando descobrir quem sou, já tive tanta certeza de mim, ao ponto de querer sumir.
Já menti e me arrependi depois, já falei a verdade e também me arrependi.
Já fingi não dar importância às pessoas que amava, para mais tarde chorar quieta em meu canto.
Já sorri chorando lágrimas de tristeza, já chorei de tanto rir.
Já acreditei em pessoas que não valiam a pena, já deixei de acreditar nas que realmente valiam.
Já tive crises de riso quando não podia.
Já quebrei pratos, copos e vasos, de raiva.
Já senti muita falta de alguém, mas nunca lhe disse.
Já gritei quando deveria calar, já calei quando deveria gritar.
Muitas vezes deixei de falar o que penso para agradar uns, outras vezes falei o que não pensava para magoar outros.
Já fingi ser o que não sou para agradar uns, já fingi ser o que não sou para desagradar outros.
Já contei piadas e mais piadas sem graça, apenas para ver um amigo feliz.
Já inventei histórias com final feliz para dar esperança a quem precisava.
Já sonhei demais, ao ponto de confundir com a realidade... Já tive medo do escuro, hoje no escuro "me acho, me agacho, fico ali".
Já cai inúmeras vezes achando que não iria me reerguer, já me reergui inúmeras vezes achando que não cairia mais.
Já liguei para quem não queria apenas para não ligar para quem realmente queria.
Já corri atrás de um carro, por ele levar embora, quem eu amava.
Já chamei pela mamãe no meio da noite fugindo de um pesadelo. Mas ela não apareceu e foi um pesadelo maior ainda.
Já chamei pessoas próximas de "amigo" e descobri que não eram... Algumas pessoas nunca precisei chamar de nada e sempre foram e serão especiais para mim.
Não me dêem fórmulas certas, porque eu não espero acertar sempre.
Não me mostre o que esperam de mim, porque vou seguir meu coração!
Não me façam ser o que não sou, não me convidem a ser igual, porque sinceramente sou diferente!
Não sei amar pela metade, não sei viver de mentiras, não sei voar com os pés no chão.
Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra SEMPRE!
Gosto dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais poderosas, das idéias mais insanas, dos pensamentos mais complexos, dos sentimentos mais fortes.
Tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar de um penhasco q eu vou dizer:
- E daí? EU ADORO VOAR!


Clarice Lispector