quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Eu gosto dele - 30/07/2013

Eu gosto dele. É o que respondo sempre que perguntam como está indo o namoro ou querem me pegar como exemplo em alguma conversa sentimentalista. E enquanto a pessoa desenvolve seu argumento baseado no meu “gostar”, eu divago com meus botões se menti pra nós duas. Fico buscando as razões pelas quais “eu gosto dele”.

Ele é confiável, companheiro, bom ouvinte, dedicado, inteligente, divertido. É eu enumerei as qualidades de um amigo. Mas ele não é meu amigo. Quero dizer, ele é meu amigo também, mas ele tem de ser mais que isso. Ele é meu namorado, e assim sendo, tem de ser a junção de amigo e amante. Ah, ele é bonito, beija bem e nos entendemos na cama. 

Continua não me parecendo o bastante. O “Ah” no começo da sentença já denuncia o problema. “Ah” não enuncia romance. “Ah” não inicia paixões. “Ah” não inspira canções de Bon Jovi. “Ah” não gera saudade. Namoros não devem começar com “Ah”. 

“Ah” é qualquer-coisa ou vai-esse-mesmo. “Ah” é pra quando você quer sabor morango, mas só tem tutti-frutti. Mas ainda não é assim que me sinto. Não o escolhi pra meu namorado porque outro cara tinha ido viajar. Foi por que mesmo? Tinha a emoção de tentar um novo amor, desvendar alguém, se embrenhar no íntimo. Uma empolgação de criança que acaba de ganhar um brinquedo automatizado e quer descobrir como funciona.

Lá se foram seis meses e ele já está na estante, guardado. Integrado ao resto da bugiganga. Nosso relacionamento não ta frio não. Tá morno. Temperatura média, normal. Mas banho morno não tem graça. Bom mesmo é banho quente, que te prende embaixo do chuveiro. 

Bom mesmo é a intensidade. Beijos que esfriam a barriga e aquecem o resto do corpo. Lábios com vontade própria, que se atraem e se reencontram mesmo já tendo se despedido. É sentir saudade trinta minutos depois de terem se visto (e ficar relembrando o encontro). É sentir a dor da falta se desfazendo no abraço acolhedor – não há sensação igual. É fazer contagem regressiva pro próximo final de semana, não aguentar e se verem na terça-feira. Bom mesmo é sentir esse imediatismo.

E eu. Eu sinto a falta de sentir isso e não quero ir embora. Fico insatisfeita por não estar apaixonada, mas não o suficiente pra romper. Li num texto do Gabito Nunes que os jovens amam loucamente e os velhos teoricamente. Talvez seja isso. Talvez tenha encontrado esse tipo de amor maduro e ainda não saiba como lidar. Talvez esse seja tão bom quanto ou melhor do que o tipo debutante e eu só precise descobrir como funciona.

Findadas as minhas reflexões me contento com a conclusão que cheguei. Espero a pessoa terminar de falar e soltar aquele quase retórico “entende?”. Sorrio e, agora um pouco mais confiante, respondo: Sim, eu gosto dele.

Eu prefiro os domingos - 19/02/2015

E devagar se acabou o bloco. A batucada deu lugar ao ruído de vozes boêmias que, aos poucos, iam também silenciando. A quarta-feira, outrora de cinzas, era agora a de ressaca para alguns.

Enquanto observava os jovens foliões retornarem ao lar com calçados na mão e sorrisos satisfeitos no rosto, pensava consigo que aquela alegria não era a mesma dele. Pensava que, apesar de poder ter sido muito bom beijar tantas bocas na micareta, mal sabiam eles quão melhor é beijar uma boca e saber que essa é sua e só. Possuir não só a boca, mas corpo e alma de outro alguém, num tipo de posse que só se faz possível quando esse alguém se permite e renuncia a si mesmo, para viver no peito do outro.

Lembrava, com uma saudade sufocante, da menina que se deixou pertencer e apressou o passo, sem nem notar, pra sentir mais cedo o perfume dela. Para abraçá-la e fazê-la saber que as segundas, terças e quartas-feiras também eram dela. Para contar pra ela que não conseguiu esperar pelo próximo domingo.

Sem título - 04/07/2014

No fim, acho que não é mesmo amor, é curiosidade. Porque desde criança tenho esse fascínio por quebra-cabeças e você deixou tantas peças por se encaixar, que eu simplesmente não consigo seguir em frente. Não com um passado incompleto a me assombrar. Preciso saber como você terminaria aquela frase que cortei e que gosto teria o beijo que evitei virando o rosto. 

Fico me perguntando se, se eu tivesse ficado naquela noite em que implorou que não fosse embora, você teria feito ou dito algo que pusesse um fim nesse nosso lance sem nome. Imaginando como teria sido dormir e acordar contigo. Especulava o motivo de eu ter sido quase intocável pra você, quando me olhava com os olhos incrédulos. 

O que vivemos foi um belo quadro, mas quando o olho me tortura ver essas peças faltando aqui e ali. Espaços etiquetados com uma grande e irritante interrogação. “Decifra-me ou devoro-te”, gritam. Não sei como silenciá-los e menos ainda como decifrá-los. 

Eu fui e você foi. Nos afastamos tanto que talvez nem nos reconheçamos mais. O jeito é me adaptar, aprender a conviver com esses gritos oscilantes. Amo quebra-cabeças, mas amo ainda mais fingir inatingibilidade e manter meu orgulho intacto. Deixo o destino e os ventos se encarregarem do que tiver que ser. E eu estou bem pra caramba.

Pedido público de desculpas aos meus quase-amores - 11/07/2014


Do “eu não estava pronta” ao “foi melhor assim”, meditei sobre cada um e lancei mão de todos:

Desculpem. Eu só não amava vocês

Sem título - 29/04/2013

Se eu pudesse escolher nunca ter te conhecido, acredito que o faria. Você está presente em todos os dias da minha vida, seja num riso que me lembra o teu, um lugar o qual frequentávamos, um gosto em comum citado por um estranho. Eu não consigo me desvencilhar de você e, às vezes, tenho a impressão de que tem ficado cada dia mais difícil.

Eu tenho tentado. Juro. Envolvo-me com outras pessoas, saio com amigos. Tenho me distraído a exaustão numa manobra contra sua insistente lembrança. E confesso que funciona por um tempo, em seguida tenho nojo de mim mesma. É como se gostar de uma pessoa que não você fosse totalmente antinatural, inconcebível. Impossível.

Não sei lhe dizer se me machuca mais não te ter ou ter alguém que não quero verdadeiramente. Tenho ódio, me sinto enganando a ele – e a mim. Que direito tenho eu de iludir? Eu que sei tão bem o estrago que isso faz. Não, você não me iludiu. Nós é que temos mania de criar expectativas. Esperar que o outro nos devolva tudo que oferecemos e entregue o que nos falta. A esperança que o outro nos complete nos decepciona quando em vão.

Vazio - 21/09/2011

Vazio. O aperto no peito está lá, mas sua mente não identifica bem o que é. Consome maços inteiros, sente o coração chegar à garganta, o ar rarear... Nada. É engolido pela ansiedade sem razão, ou por uma razão que não gosta de lembrar, e sai para caminhar. Vê a rua, os vizinhos, as crianças no parque, vira-latas sendo escorraçados de portas de padaria. Tudo igual, tudo como supunha estar. 

Tem agora a idade que faz com que os outros o julguem despreocupado. Como se os dias e desventuras envelhecessem com o corpo. Como se os problemas poupassem os mais velhos e a paz tivesse os bancos reservados do transporte público. Essas crianças não sabem mesmo de muita coisa - bom pra elas. Mal sabem que o futuro as aguarda com o peso dos silêncios.