Envelhecer e descobrir que não existe
mesmo isso de esquecer, de desamar. Você apertar a mão de quem um dia foi seu
mundo inteiro e não sentir absolutamente nada. Não existe, cara. Você se
afasta, muda de ares e de amigos, deixa de revisitar lembranças e jura que está
acabado. Mas um belo dia, ao rever aquela pessoa, sente uma coisinha se
revirar, espreguiçar e acordar no peito: pronto, está vivo de novo.
Um aperto de mão de meio segundo
e uma avalanche de sentimentos vem em sua direção, perto e rápido demais pra
desviar, está feito, você é atingido. Quando se dá conta está forçando um
sorriso e olhando pros lados, tentando inviavelmente fugir. O coração bate
descompassado e torce pra que ninguém note que está se sentindo como no dia da
defesa do seu tcc, ansioso pra provar que esses semestres tiveram valia e você
realmente aprendeu a lição. Eu sei, foi exatamente como me senti.
Ela usava salto alto e um vestido justo turquesa,
de comprimento um pouco acima do joelho, que contrastava com tudo que gostava
de vestir e contrariava sua personalidade despojada que tanto admirei. Cabelos
soltos em cachos minuciosamente modelados para durar toda a noite e batom
vermelho para arrematar. Dizem que se deve vestir bem quando for a um encontro
e ainda melhor se for encontrar um ex. Estava linda, com todas as curvas que me
lembrava, mas o acessório que ostentava me fez questionar essa teoria: um
acompanhante.
Eu, o cara solteiro que vai ao
casamento do amigo azarar as primas da noiva. Não sei se é o que todos estavam pensando, mas
é o que achei que ela pensaria de mim. Derrotado, ainda sozinho depois de todos
esses anos. Impressão que só piorou quando disse em seguida “Esse é o Otário,
meu noivo”. O Otário apertou minha mão mais forte que o comum enquanto passava
o braço em volta da cintura dela, o que me fez desejar que ele tivesse um
aneurisma naquele instante e caísse duro no chão, um trágico e feliz final. Mas
apenas o assisti tirá-la para dançar e caminharem juntos para o meio do salão.
Não conversamos mais naquele dia
e nem em outro algum. Na semana seguinte fiquei me perguntando o porquê de todo
aquele desconforto, do ciúme, da frustração por não poder ter novamente, da
tristeza ao vê-la sair pela porta. Li o perfil público dela no Facebook de
ponta a ponta e procurei seu rosto nas fotos do casamento postadas mais tarde.
Buscava o registro de um olhar furtivo na minha direção ou um sorriso amarelo
que denunciasse que estava tão desconfortável quanto eu. Queria uma pista de
que estava secretamente infeliz e sentindo minha falta. Não encontrei.
Pensei várias vezes em ligar,
marcar uma cerveja, reconquistá-la aos pouquinhos. Pensei que foi um erro tê-la
deixado escapar e que ainda estava profundamente apaixonado por ela. Nada fiz. Após um tempo, deixei de pensar naquela festa.
Senti aquela coisinha no peito revirar e adormecer de novo, quieta. Acredito
que, se a ver mais uma vez, a coisinha vai se agitar e fazer algum barulho, mas
nunca terá força suficiente pra me fazer discar o número dela de novo. Essa se foi
há tempo demais, quando decidimos juntos que não dávamos mais certo. Segui.
O nome do noivo dela é Tarcísio.
Mas, já me conformei, será sempre Otário pra mim.