quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Chá&Café


Pare e observe. Eu não aguento isso. Por que você não enxerga que estou aqui me corroendo? Você sabe, eu me faço de forte. Finjo que não me importo, que não sinto falta de te olhar nos olhos. Mas achei que ficasse meio óbvio que estou desconfortável quando resolvo ouvir música no segundo em que você pega um livro. Quando respondo monossilabicamente todas as suas tentativas de conversa casual. Quando eu corro pra janela só pra ver você descendo a rua depois que bate a porta. Quando imploro muda pra que você coloque um fim nisso tudo. Quando... Até quando? Esses não somos nós.

Quando eu ouço música você levanta e me tira pra dançar. Quando você está fatigado, eu te abraço e digo como tudo vai ficar bem. Quando estou emburrada, você me faz rir dizendo que fico linda ressaltando minhas rugas. Quando você lê, eu te trago café e me recosto no seu ombro. Quando eu chego, você me traz chá e deita comigo no sofá. Quando você sai para o trabalho, eu te levo até a porta e me despeço com um beijo.  Você está vendo? Esses somos nós. Somos melodramáticos e felizes – ou éramos.

Agora somos qualquer coisa muito distante de “felizes”. Você fica sentado na poltrona, tomando um café horrível que você mesmo fez. Pega seu livro de finanças e finge estar absorto, mas eu sei que o franzido na sua testa não é de concentração. Quase posso ouvir seus pensamentos de tão alto que gritam em sua mente. Gostaria de poder ouvir. Sei que está pensando em nós e em como a cada dia o clima fica mais pesado, beirando o insustentável. Nossa descrença é quase palpável pairando no ar. Gostaria mesmo de poder ouvir seus pensamentos. Assim saberia se pra você a solução é consertar ou jogar fora. Adquirir uma nova. Só em pensar me vejo nervosa.

Nervosa. Nervosa define bem o que tenho sido ultimamente. Estou sempre a flor da pele e a culpa é sua/nossa. Qualquer um lê no meu rosto como a sua distância presente me faz mal. Cada poro da minha pele exala frustração. E se isso não basta para enxergarem, minhas olheiras denunciam que há algo de errado. Como consegue dormir? Por mais que eu faça, não consigo. Passo a noite velando teu sono, vendo teu peito subir e descer. Me perguntando quando foi que começamos a nos distanciar, se é que realmente há um evento exato no tempo que inaugurou o início do nosso fim. Se foi quando eu arranhei o seu carro ou você o meu disco. O que foi que arranhou a nossa existência perfeita? Não, não estou exagerando. Nós éramos perfeitos. Ao menos você sempre foi pra mim.

Eu tenho uma ideia. Eu descarto meu orgulho, você o seu senso de justiça. Fiquemos bem. Vamos fingir que nada aconteceu. Você nunca gritou comigo, eu nunca te empurrei. Tudo isso não passou de um sonho ruim. Quando chegar, eu faço chá e um café fresquinho só pra você. Você me conta como foi seu dia e o quanto sentiu vontade de me ligar no meio da reunião pra contar como é hilário o Siqueira praticando seu “portunhol” com os sócios. E então você me beija e diz que está na hora de subirmos pro nosso quarto pra não dormirmos. Pra matar essa falta que eu estou de você. Ou pra levarmos o colchão pra sala, pedir pizza e ficarmos vendo filmes repetidos que nunca enjoamos.

Eu aceito a ideia. Você podia aceitar também. Nós somos passíveis de conserto. Porque temos muito a conviver e aprender um sobre o outro. Eu vou ver esse seu topete perder volume e você vai me ver perder certas curvas. E vamos nos amar ainda mais pra compensar essa perda. Comecemos de novo, nem precisa falar nada. Façamos um acordo calado. É só chegar e pegar o que ainda é seu e será por muito tempo.